O tempo estava fechando. Nuvens feias encobriam o Gólgota. Um vento frio fazia as pessoas se encolherem e se encostar umas nas outras. Maria fechou os olhos acreditando que a dor se tornaria suportável. As memórias afetivas voltaram. Sentiu as pernas estremecerem ao visualizar a pacata casa de Nazareth de onde contemplava as coxilhas que se espraiavam por sua janela e a pequena aldeia que ficava tão perto.
Ali foram felizes. Tinham uma família. Jesus assumira José como "pai do coração". E Jesus se sentia orgulhoso de ser chamado "filho do carpinteiro". Rezavam juntos, trabalhavam unidos e passeavam, satisfazendo a curiosidade do menino que parecia não ter fim... E ele crescia em sabedoria "diante de Deus e dos homens".
Depois, encontrou o evangelista Lucas que pediu detalhes do que viu, ouviu e sentiu na prisão de seu Filho e o que passara até sua morte. Estivera com os apóstolos durante o jantar e não quis ficar no lugar da ceia quando Jesus saiu. Permaneceu de longe para não perturbar as orações e foi o motivo para terem acompanhado a prisão.
Viu João e Pedro, mas especialmente as mulheres que a acompanhavam e entravam nos diversos lugares para onde conduziram Jesus. Não entendia porque faziam aquilo. Seria o seu tempo? Era muito cedo, não podia perdê-lo. O filho tinha apenas 33 anos! Seu coração, no entanto, estava apertado e dolorosamente lhe dizia que era o fim.
Fez a sua própria via sacra percorrendo os palácios e o caminho até um dos lugares mais feios de Jerusalém: o Gólgota, onde os romanos mantinham cruzes erguidas para advertir seu povo de que qualquer contrariedade podia custar a vida. Uma morte lenta, muitas vezes abreviada com o transpassar de uma lança. Aquelas marcas da infâmia eram vistas de praticamente todas as estradas que entravam ou saiam de Jerusalém.
No caminho, um último encontro, quando pensou dizer palavras de conforto e elas ficaram presas na garganta, quando devia consolar, acabou por ser consolada... Em meio ao sangue, machucados e às escoriações, o olhar de Jesus dizia que este era o seu destino e que, depois, ainda havia muita estrada a percorrer. Já não tinha mais forças. Amparada andou o caminho que lhe pareceu tão longo...
Mesmo que seu corpo inteiro doesse com a saudade, sabia que não era o fim. O filho falara em ressurreição: difícil de entender, mas necessário de acreditar. Do anúncio do nascimento ao momento da agonia dera um novo sentido à fé do seu povo. Razão para acreditar que a Páscoa (passagem) a partir de agora, se daria em cada mente, em cada coração. Bem ali onde seu Jesus plantara a certeza de que o homem alcançara um novo pacto com Deus! Em 2019, feliz Páscoa! E uma abençoada Ressurreição!